Energia solar mais acessível em até cinco anos

Pernambuco - Quando falta energia elétrica e o breu se faz presente em todas as ruas e casas do bairro de Jardim Jordão, em Jaboatão dos Guararapes, Grande Recife, existe uma luz que permanece acesa na morada simples de Josué Cipriano e seus vizinhos de parede. “Se todo mundo soubesse aproveitar a energia que vem do sol, ninguém ficaria na escuridão; nunca mais”, ensina o comerciante que, nas horas vagas, se transforma em inventor no melhor estilo “Professor Pardal”, com diversas aplicações de placas fotovoltaicas para gerar energia e facilitar o dia a dia do ser humano, sem agredir o meio ambiente, como faz questão de frisar. Com a ajuda dos amigos, fez instalações em bicicletas, carrinho de sorvete, postes e até barcos. Tudo movido à energia solar. As experiências, batizadas de projeto Gira-Sol, são realizadas com recursos próprios, mas, aos poucos, já começam a chamar a atenção de órgãos públicos e prefeituras. “Já fizemos algumas exposições em zoológico, feiras da Secretaria de Meio Ambiente de Ipojuca (cidade também do Grande Recife) e, recentemente, fornecemos dois barcos ao Espaço Ciência, no Recife”, enumera, com orgulho. Assim como o sol, ideias não faltam para Josué. Porém ainda é preciso investimento financeiro para acompanhar a capacidade criativa e o bolso do grupo. “Gastamos nosso dinheiro nisso porque acreditamos que estamos construindo algo importante para a sociedade. E, se não fazemos mais, ainda é porque as placas são muito caras”.

E são mesmo. Uma placa fotovoltaica custa, em média, R$ 1.500. Para abastecer uma residência com quatro pessoas, seriam necessárias, pelo menos, 10 placas. Com os custos de instalação, baterias e inversor, um sistema isolado de energia solar para produção de energia elétrica sai em torno de R$ 30 mil. “A tecnologia ainda é muito cara, e o consumidor demora a receber de volta o investimento, que se paga em dez anos”, explica Carlos Salviano, da Salviano Engenharia, empresa que atua no setor. Não é à toa que o maior uso do potencial de energia solar no mercado doméstico é para aquecimento de água. “Hotéis, condomínios e residências de alto padrão são clientes frequentes. Deixam de consumir energia elétrica dos chuveiros e das torneiras e, em pouco tempo, desfrutam de uma economia de 20% a 30% na conta de luz”. Atualmente, o custo do sistema de aquecimento solar da água para uma casa com quatro pessoas e dois chuveiros, por exemplo, fica por R$ 3 mil e se paga em dois anos ou menos, dependendo da intensidade do uso. “Quanto mais se usa, mais rápido percebe o retorno do investimento”, ressalta Salviano, que estima um crescimento anual de 20% a 25% da procura por esse tipo de serviço.

As construtoras também já começam a enxergar os benefícios, passando a incorporar nos projetos aplicação de energia solar para água de banho, entre outras ações de sustentabilidade e eficiência energética. É o caso do condomínio Morada da Península, situado na Reserva do Paiva, Cabo de Santo Agostinho. Todas as 66 casas de alto padrão, além do clube e áreas comuns de lazer, utilizam painel de energia solar para aquecimento da água dos chuveiros e torneiras. “Houve uma boa aceitação do mercado. É uma tendência não só por parte dos clientes, mas dos empreendedores, que seria acentuada com incentivo fiscal”, destaca o diretor de Incorporação da Odebrecht Realizações Imobiliárias em Pernambuco, Luis Henrique Oliveira. Segundo ele, a sustentabilidade nos empreendimentos imobiliários ainda é um desafio porque não existem incentivos para aplicar esses dispositivos no mercado, encarecendo de 5% a 8% o custo total da obra. “Os empreendedores têm um custo a mais, e o benefício vai para o cliente, que não quer pagar por isso. Mas é bom para cidade e para as gerações futuras”.

Foi pensando no meio ambiente e na economia na conta de energia elétrica que o casal Lauro Castelo Branco e Ana Lúcia Miranda aceitou, assim como os demais vizinhos, a proposta da construtora de utilizar placas solares e boilers no prédio de classe média onde moram, na Madalena, Zona Oeste do Recife. Cada família dos 56 apartamentos pagou R$ 5 mil para fazer a instalação, ainda no início de construção do prédio, em 2004. “Em um ano e meio de uso, já foi possível perceber a economia de quase R$ 100 por mês na conta de luz”, afirma Lauro, que é síndico do edifício. “A água chega nas torneiras e nos chuveiros bem quente e é necessário fazer o controle com água fria para baixar a temperatura. No mais, é só controlar o tempo do banho dos filhos, sem esquecer de economizar água também”, completa Ana Lúcia, mãe de dois adolescentes.

À noite, a água fornecida ainda é morna. “Nos dias muito chuvosos ou no período do inverno, acionamos o aquecedor a gás natural, mas é apenas como apoio. Voltando o sol, automaticamente o fornecimento de gás é interrompido”, explica Jonas Bezerra, representante da Solar Tech, empresa responsável pela instalação e manutenção do sistema no prédio e em mais outros três na cidade. Para o diretor da construtora AC Cruz, André Callou, a demanda espontânea do consumidor para o uso de energia solar ainda não existe. “Se mais empresas apresentarem essas ofertas, vai despertar o interesse dos clientes, mas é importante também ter no mercado um maior número de fornecedores e empresas com capacidade de atender volumes”.

A expectativa é de que, assim como aconteceu com o estabelecimento da indústria de energia eólica, Pernambuco também consiga atrair investimentos para o avanço da energia solar no Estado. Especialistas esperam uma mudança substancial do cenário nos próximos anos. “Os custos da solar estão baixando com relativa rapidez. O preço está caindo muito. Espera-se que a competitividade da energia solar para a geração de energia elétrica seja uma realidade nos próximos cinco anos, está muito próximo”, salienta o professor e pesquisador do Centro de Energias Renováveis (CER) da Universidade Federal de Pernambuco, Chigueru Tiba.

Na área da pesquisa, o tema também avança. De acordo com o professor, que coordenou a publicação do Atlas Solarimétrico do Brasil - Banco de Dados Terrestres -, o programa de pesquisa e desenvolvimento estratégico da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é um marco de virada para o setor. A iniciativa, chamada de “Arranjos técnicos e comerciais para a inserção da geração fotovoltaica na matriz energética brasileira” e lançada em outubro de 2011, engloba 18 projetos que somam 24,5 MW de potência e investimento de R$ 395,9 milhões. Um deles é a recém-anunciada usina solar na Arena Pernambuco, em São Lourenço da Mata, Grande Recife.

Potencial

O Brasil é um dos países com maiores níveis de radiação solar do mundo. Isso porque a maior parte do território brasileiro está localizada na Zona Intertropical, entre a linha do Equador e o Trópico de Capricórnio, de forma que não se observam grandes variações na duração solar do dia. No Nordeste, em particular, a diferença entre o inverno e verão é pequena, permitindo uma geração de energia plana, estável. “Se considerarmos o semiárido nordestino, é muito interessante porque não vai competir normalmente no uso e ocupação do solo. Temos baixa densidade de população, alto nível de radiação solar e a possibilidade de gerar emprego e renda na região”, enumera Tiba. A cidade de Petrolina, Sertão do Estado, por exemplo, apresenta de acordo com o Atlas Solarimétrico, potenciais para produção de energia solar comparados aos melhores sítios do mundo, como os da cidade de Dongola, no Sudão, e Dagget, no deserto do Mojave, Estados Unidos.

É em Petrolina onde o grupo de pesquisa de fontes alternativas de energia da UFPE está trabalhando há quatro anos na implantação de uma central termosolar de 1MW. O projeto, coordenado pelo Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), entidade ligada à Eletrobras, em parceria com a Secretaria de Ciência e Tecnologia de Pernambuco (SecTec-PE), está em fase final de tramitação junto ao Finep. “Será o primeiro projeto de grande porte do Estado: a primeira central termosolar do Brasil e talvez até da América Latina, onde estaremos oferecendo um local de pesquisa e experimentação da tecnologia solar”, comemora. A previsão é de que o projeto comece a sair do papel em seis meses e tenha um prazo de três anos para ficar pronto. “Será o local com infraestrutura onde grandes empresas do setor energético poderão testar e experimentar tecnologia industrial, com oficinas e pessoal treinado”. Além disso, a UFPE lançou junto com a Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf) um projeto de usina fotovoltaica para produção de 2,5 MW e interligada à rede elétrica. “Com esses dois projetos, a plataforma de energia solar de Pernambuco estará caminhando para a consolidação”, afirma.

Fonte: Portal NE

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